segunda-feira, 28 de setembro de 2009

DESMISTIFICANDO O DANO MORAL.

Dano moral é aquele que atinge os direitos da personalidade ou aquele que causa sofrimento à vítima.
O dano moral tem por base o princípio da satisfação compensatória, ou seja, a indenização representa o valor necessário para proporcionar à vítima um lenitivo para o sofrimento infligido, ou uma compensação pela ofensa ao direito da personalidade – Fernando Noronha.
Assim, não se fala em ressarcimento, mas em reparação, pois é impossível que a vítima retorne ao estado anterior.
Vale notar ainda que, o dano moral não se confunde com o estético, que atualmente é tratado como uma terceira espécie de dano e, portanto, admite-se indenização por dano moral, material e estético (REsp. 65.393).
Nesse sentido, pode-se dizer que o dano estético é a alteração morfológica do indivíduo que implique sob qualquer aspecto no afeamento da vítima, e seja irreversível.

Ademais, pode-se classificar os danos morais em:

a) dano moral subjetivo e dano moral objetivo. O subjetivo é o que precisa ser comprovado pela vítima. É a regra no sistema. Dano objetivo é o dano presumido e independe de prova. É chamado dano in re ipsa. Ocorre nas hipóteses de perda de pai ou filho, de parte do corpo e a jurisprudência tem entendido que também ocorre com a inscrição indevida na pessoa na Serasa e no SPC. Portanto, dano moral in re ipsa, outra coisa não é senão uma hipótese de dano que dispensa prova em juízo. Nesse sentido, Resp-RS 718618, e Resp-RJ 357404.

b) dano moral direto e indireto. O direto é aquele que atinge a própria vítima, exemplos, dano a imagem; perda de parte do corpo. O indireto é aquele que atinge a vítima de forma reflexa, pois a lesão atinge diretamente terceira pessoa ou bem patrimonial da vítima. A perda de coisa com valor afetivo gera dano moral indireto.

Os meros aborrecimentos não constituem dano moral. A vida em sociedade é naturalmente causa de aborrecimentos e, portanto, pequeno desconforto não significa dano moral. Enunciado 159 do CJF: “o dano moral não se confunde com os meros aborrecimentos decorrentes do prejuízo material”.

Advirta-se que forte embate existe quanto a natureza jurídica da indenização por dano moral, onde cita-se as seguintes correntes:

1ª. Corrente – a indenização tem apenas intuito reparatório, sem qualquer caráter disciplinador;
2ª. Corrente – a indenização tem caráter punitivo, disciplinador. É a chamada teoria do desestímulo (puniteve damages);
3ª. Corrente – a indenização tem o caráter principal reparatório, e o caráter disciplinador acessório, visando a coibir novas condutas do agressor.

A terceira teoria é amplamente admitida na doutrina e na jurisprudência.

Aliás, o caráter reparatório está previsto em lei (art. 944), mas o caráter disciplinador, não. Assim, o projeto 276/07 pretende acrescentar um parágrafo ao art. 944 com a seguinte redação: “a reparação do dano moral deve constituir-se em compensação ao lesado e adequado desestímulo ao lesante”. O Enunciado 379 entende que o CC não afasta a possibilidade de se reconhecer a função punitiva ou pedagógica da responsabilidade civil.

Por fim, cumpre dizer que os valores fixados pela jurisprudência para a indenização, estão assim postos: (não se trata de regra, mas de valores normalmente fixados).

a) perda de pessoa da família – entre 300 a 500 salários mínimos;

b) nome indevidamente inscrito na Serasa e no SPC – 50 salários mínimos (TJ/RJ fixa em 40).
Cuidado: a tarifação do dano moral seria considerada inconstitucional por lesão ao princípio da isonomia, já que trata os desiguais de maneira igual. Por isso, a tarifação prevista na lei de imprensa não tem sido aplicada pelos tribunais.

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

O QUE É TENTATIVA QUALIFICADA OU ABANDONADA?

Tentativa qualificada ou também chamada tentativa abandonada outra coisa não é senão os institutos do ARREPENDIMENTO EFICAZ (que ocorre quando o agente, desejando retroceder na atividade delituosa percorrida, desenvolve nova conduta, depois de terminada a execução criminosa. Assim agindo evita eficazmente o resultado) e da DESISTÊNCIA VOLUNTÁRIA (que ocorre quando o sujeito ativo abandona a execução do crime quando ainda lhe sobrava, do ponto de vista objetivo, uma margem de ação). Ambos os institutos encontram-se previstos no art. 15 do Código Penal.
Qual a resposta penal ao agente que se arrependeu eficazmente ou desistiu voluntariamente? Responderá pelos atos até então praticados.

Aproveitando-se o ensejo, pergunta-se: Qual a natureza jurídica da tentativa qualificada ou tentativa abandonada? Há duas correntes explicativas:


1ª corrente - Miguel Reale Júnior: CAUSA DE ATIPICIDADE DA TENTATIVA. Explica: Se o crime não se consuma por circunstâncias inerentes à vontade do agente não se aplicará a norma de extensão do art. 14, II, do CP. Assim, não haverá tipicidade.

2ª corrente - Nelson Hungria: Em algum momento da execução o agente teve vontade de produzir o resultado, motivo por que a tentativa não é punida por questão de política criminal. Logo, trata-se de uma CAUSA DE EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE DA TENTATIVA POR QUESTÕES DE POLÍTICA CRIMINAL.

domingo, 20 de setembro de 2009

O que vem a ser PACTO ESTAMENTAL?

A colocação do termo PACTO ESTAMENTAL encontra ressonância no estudo da história do constitucionalismo, isso porque, há uma experiência muito conhecida na Inglaterra, embora isso não tenha acontecido só na Inglaterra, que era o pacto estamental entre o rei e alguns grupos, ou seja, um acordo entre um estamento (rei) com outros estamentos (nobreza e clero). Nesse sentido, o exemplo mais famoso que se pode citar, é a Magna Carta da Inglaterra.


Nesses termos, vale advertir que, muitas pessoas dizem que a primeira Constituição teria sido a Magna Carta da Inglaterra (a conhceida Magna Carta de João Sem Terra). Todavia, se formos pensar em Constituição no sentido moderno (leia-se, Constituição como a Lei maior de um Estado, ou seja,o constitucionalismo como tradução na idéia da Lei. Lei essa, encarnação da vontade geral do povo), a Magna Carta não foi uma Constituição. A Magna Carta foi somente um acordo, já que o rei inglês João Sem Terra, que estava em guerra com a França, queria um apoio dos nobres.


Nota-se ,que João Sem Terra, na verdade, fez um acordo com estamentos (nobreza e clero), dizendo por exemplo: eu me comprometo, a não instituir um tributo sobre vocês sem antes consultá-los em assembléia. Eu não vou julgar vocês, vocês serão julgados pelos seus próprios pares. Eu me comprometo ao exercer o meu poder a respeitar os costumes da terra. Em contra partida, vocês vão aceitar que eu vou exercer um poder sobre vocês. Eu vou ser uma espécie de suserano e vocês vão ser os meus vassalos.


Então, isso foi um pacto. Um pacto que só começou a ser aplicado na Inglaterra em relação a outros estamentos que não a nobreza e o clero, no século XVII pela influência de um jurista chamado Edward (precursor do controle de constitucionalidade das leis).


Infere-se por isso que, a Magna Carta não era uma Constituição, mas sim um pacto estamental no qual estava presente a idéia de limitação ao exercício do poder. Dessa maneira, um dos corações do constitucionalismo.

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

CUMULAÇÃO DE PEDIDOS NO PROCESSO CIVIL.

Em princípio, há dois tipos de cumulação: a cumulação própria, em que é possível o acolhimento de todos os pedidos; e a cumulação imprópria, na qual existe mais de um pedido, mas apenas um poderá ser acolhido.

A cumulação própria, ou em sentido estrito, se divide:

a) cumulação própria simples – os pedidos são independentes, o resultado de um não influi no resultado de outro. Ex: pedidos de dano moral e dano material.

b) cumulação própria sucessiva – existe relação de dependência entre os pedidos. O pedido posterior só será apreciado se o pedido anterior for acolhido. Ex: investigação de paternidade cumulada com alimentos; rescisão do contrato por culpa e pagamento de multa compensatória.

Por seu turno, a cumulação imprópria se divide:

a) cumulação imprópria subsidiária, ou cumulação eventual – os pedidos são apresentados em ordem de preferência; os anteriores são principais, os posteriores, na impossibilidade de acolhimento dos principais, são formulados subsidiariamente. Ex: pedido de entrega do veículo comprado, ou de um veículo do mesmo modelo, ou do valor pago corrigido e com juros.

b) cumulação alternativa – não há ordem de preferência, o autor pretende qualquer um dos pedidos, ou seja, ele formula dois pedidos e o acolhimento de qualquer deles o satisfaz.

Nesse sentido, sobrevela notar que, os requisitos para cumulação de pedidos (art. 292 do CPC) são:

1. Compatibilidade entre os pedidos (esse requisito só é exigido na cumulação própria).

2. Competência do juízo para todos os pedidosse a competência for absolutamente distinta, não é possível a cumulação. Ex: quando um pedido é contra o particular e o outro contra a União. Por outro lado, se a competência for relativamente diferente, será possível a cumulação se: a) os pedidos forem conexos, pois neste caso, em razão da conexão e da prevenção, a competência do juízo fica prorrogada para todos os pedidos; e, b) não havendo conexão, se o réu não oferecer exceção no prazo de resposta, também ocorre a prorrogação da competência. Neste caso, se for oposta a exceção, o juiz desmembrará as ações, frustrando a cumulação.

3. O procedimento deve ser adequado para todos os pedidos, ou deve o autor optar pelo procedimento ordinário (art. 292, §2ª do CPC). Cuidado, pois, quando a lei fala em adotar o procedimento ordinário, significa adotar o procedimento mais amplo dentre os previstos para os pedidos. Assim, se a cumulação for entre um pedido de procedimento sumaríssimo e outro de procedimento sumário, adota-se o sumário. Se houver um terceiro pedido de procedimento ordinário, adota-se este (na justiça estadual, pois na federal, a competência do JEC é absoluta, impedindo a cumulação no juízo comum). Ainda mais, destaque especial deverá ser dado quando houver procedimento especial, isso porque, só será possível cumular, adotando-se o procedimento ordinário. Destarte, isso somente será aplicado naqueles falsos procedimentos especiais, ou seja, naqueles que só têm uma fase inicial diferenciada – ex: possessórias. Uma vez que, nos procedimentos especiais genuínos, não será possível adotar o procedimento ordinário (aqueles totalmente diferenciados).

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

CONCURSO DE CRIMES DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO: SOLUÇÃO.

O que se deve fazer quando ocorrer concurso de crimes de menor potêncial ofensivo: Somar as penas ou considerar cada crime isoladamente para fins de se aplicar a Lei 9.099/95?
1. Considerando que, todos os crimes são de menor potencial ofensivo, ou seja, a pena máxima de cada infração não ultrapassa 2 (dois) anos, infere-se pela aplicabilidade do procedimento previsto na Lei 9.099/95;

2. Considerando ademais que, conquanto se tenha entendimentos doutrinários e decisões sedimentadas, principalmente no Supremo Tribunal Federal (súmula 723) e Superior Tribunal de Justiça (súmula 243), quanto ao SURSI PROCESSUAL, determinando que se leve em conta a somatória das penas em caso de concurso de crimes para o fim de aplicabilidade ou não do referido instituto. Tal entendimento, data vênia, NÃO SE APLICA a fim de aferir ou não se se trata da APLICABILIDADE DO DEVIDO PROCESSO ESTABELECIDO NA LEI 9.099/95, pelas seguintes RAZÕES:

2.1 Caso fosse atendida a posição no sentido apontado em analogia ao SURSI PROCESSUAL, qual seja somatória das penas no caso de concurso de crimes, haver-se-ia, inconseqüente analogia in malam partem, uma vez que, estar-se-ia afrontando diretamente o DEVIDO PROCESSO LEGAL CONSTITUCIONALMENTE ESTABELECIDO ÀS INFRAÇÕES DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO, conforme se depreende da análise do art. 98, I da Constituição Federal, isso porque, além da determinação constitucional, é prudente lembrar que, o SURSI PROCESSUAL, somente foi incluído da Lei 9.099/95 por APROVEITAMENTE LEGISLATIVO, sendo certa sua natureza de NORMA DE SOBREDIREITO, não somente aplicável aos crimes de menor potencial ofensivo, mas a todos os crimes cuja pena mínima não ultrapasse 2 (dois) anos. Portanto, descabida a analógica a tal instituto por denotar-se razões diametralmente opostas;

2.2 Ademais, fato é que, o próprio legislador atento a esse tipo de intercorrência, editou a Lei 11.313/06 alterando os arts. 60 e 61 da Lei 9.099/95, justamente garantindo e fomentando a aplicabilidade da Lei 9.099/95, conforme interpretação dos citados artigos;

2.3 Nada obstante, ainda é certo que, nosso Código Penal norteia e elucida tal situação, isso porque, estabelece expressamente ao INSTITUTO DA PRESCRIÇÃO a CISÃO DO CONCURSO DE CRIMES, onde, para cada crime haverá um cômputo de prazo prescricional isolado (art. 119 do CP). Logo, nesse passo, poder-se-ia perfeitamente haver uma analogia ante a omissão legislativa nos casos de concurso de crimes e a aplicabilidade da Lei 9.099/95;

2.4 Ainda mais, levando-se em conta INTERPRETAÇÕES LÓGICA, TELEOLÓGICA e SISTEMÁTICA, fatos contraditórios haveriam de ocorrer caso se entendesse pela aplicabilidade das regras do concurso de crimes em detrimento da competência material do juizado especial. Pois, se os fatos ocorressem em momentos destacados de tempo, e cada qual fosse encaminhado à delegacia de polícia, certamente para cada crime de menor potencial ofensivo haveria um termo circunstanciado.

2.5 Não é só, uma vez que, a própria Lei 9.099/95 (p. único do art. 60 com as alterações estabelecidas pela Lei 11.313/06), determina a cisão do concurso de crimes quando houver crime comum e crime de menor potencial ofensivo. Logo, por lógica interpretativa, não se poderia adotar postura oposta, levando-se em conta, única e exclusivamente, aspectos temporais de comunicação das infrações; E mais, se para o mais (leia-se: crime comum mais crime de menor potencial ofensivo) a Lei 9.099/95 estabelece a cisão do concurso para efeito de aplicabilidade desta lei, por que para o menos (ou seja: crimes de menor potencial ofensivo em concurso) adotar-se-ia postura diversa?;

3. Nesse sentido, considerando por por fim, a FINALIDADE RESTAURATIVA apregoada pelo procedimento da Lei 9.099/95 que há de ser atendida no nosso ordenamento jurídico;

CONCLUI-SE QUE, é lógica e legalmente plausível, a APLICABILIDADE DA LEI 9.099/95 PARA CADA CRIME CONSIDERANDO-OS ISOLADAMENTE, fato que, aliás, deverá ser atendido já no Distrito Policial que se apresentar ocorrências como esta, ou seja, LAVRATURA DE TERMO CIRCUNSTÂNCIADO PARA CADA INFRAÇÃO DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO NOTIFICADA.

CONCEPÇÃO CONSTITUCIONAL DE "FAMÍLIA".

Segundo o art. 223 da Constituição Federal (CF/88), em linhas gerais a família é decorrente dos seguintes institutos:

a) Casamento entre homem e mulher;

b) União estável: constituída pela convivência pública, contínua e duradoura entre um homem e uma mulher, havendo objetivo de constituição de família. Ademais, ressalta-se ainda que, pela CF/88 a lei deverá facilitar a conversão da união estável em casamento. Infere-se portanto que, pelo Texto Maior, a união estável não é igual ao casamento, uma vez que coisas iguais não são convertidas uma na outra (nesse sentido Maria Helena Diniz).

c) Família Monoparental: Ainda segundo a CF/88, as relações entre ascendentes e descendentes caracterizadas pelo afeto são consideradas como entidades de familia. Ex: pai solteiro que reside com duas filhas.

Pergunta-se recorrentemente se o rol do art. 226 da CF é taxativo (numerus clausulus) ou exemplificativo (numerus apertus)?
Nesse sentido, a resposta segundo doutrina e jurisprudência majoritárias é no sentido de se conisderar o rol exemplificativo, sendo admitidas outras manifestações familiares.

Ex.1: o STJ entendeu que o imóvel em que residem duas irmãs solteiras é bem de família. Essa manifestação familiar é denominada “família anaparental” (expressão cunhada por Sergio Rezende de Barros) sendo a relação familiar constituída por outros parentes que não sejam ascendentes e descendentes.

Ex.2: família mosaico – família de várias origens, constituída entre um homem e uma mulher e os vários filhos dos seus vários relacionamentos (família pluriparental).

REFLEXÃO SOBRE O EMBRIÃO DE LABORATÓRIO.

O embrião laboratorial tem a mesma proteção do nascituro?
Se reconhecermos, estar-se-á por ampliar a proteção dos direitos da personalidade do nascituro ao embrião.
Ou seja, se o tubo de ensaio tiver a proteção dos direitos da personalidade terá a imagem e a vida protegida, isso inviabilizaria as pesquisas científicas.
Na ADI 3510 discutiu-se a aplicabilidade do direito de personalidade ao nascituro. Art. 5º da lei 11.105/05 foi o objeto de discussão desta ADI.
Consoante o art. 5º, todo médico é obrigado a guardar os embriões por prazo de 02 anos, após este prazo deve consultar os interessados, que nem sempre serão pai e mãe, podendo ser doador de óvulo, não tendo interesse haverá o descarte, que é o encaminhamento para pesquisa de célula-tronco.

Dizia-se nesta ADI que não era o citado artigo compatível com a Constituição por estar negando ao tubo de laboratório os direitos de personalidade.
O STF entendeu que este artigo é compatível com a constituição independente de nova lei. Portanto, infere-se que é possível fazer pesquisa com células-tronco, pois ali (embrião no tubo de ensaio) não há direito de personalidade.
Conclui-se portanto que o embrião laboratorial não tem direito à personalidade.

terça-feira, 15 de setembro de 2009

LEI DE DROGAS: Uma visão geral do artigo 33 da Lei 11.343/06.

O Brasil, Estado Democrático de Direito, quando da promulgação de sua atual Lei Maior (dia 05 de outubro de 1988, conhecida como Constituição “Cidadã”), demonstrou grande preocupação em reprimir o tráfico de drogas, considerando-o como crime inafiançável e insuscetível de graça e anistia, fazendo por meio de um MANDADO DE CRIMINALIZAÇÃO conforme se depreende da análise do artigo 5º, inciso XLIII da Constituição Federal.

Atento ao mandado constitucional, o legislador de 2006 criminalizou o tráfico de drogas no artigo 33 da lei 11343. Anteriormente a essa lei, quando ainda não existia tipificação do crime de drogas em lei específica, aplicava-se o tipo penal contido no artigo 334 do Código Penal (contrabando). Conduto, o legislador em 1976 criou a 6368que tanto tratava de crimes envolvendo drogas, como também do aspecto processual aplicável a esses crimes. Posteriormente, somente no aspecto processual, já que a parte material fora vetada, criou-se a lei 10409/02 (o que, diga-se de passagem, tornou a lei de drogas uma colcha de retalhos, uma vez que, a parte de crimes ficou a cargo da lei 6368/76, já a parte processual, ficou para lei 10409/02; motivo de muita discussão acerca da aplicabilidade das leis 6368/76 e 10409/02, haja vista, a problematização das normas híbridas, o que, aliás, não restou pacificado nos tribunais.).

Nesse sentido, a OBJETIVIDADE JURÍDICA da lei 113434/06 é garantir a INCOLUMIDADE PÚBLICA, no aspecto saúde pública. Preocupação essa que, foi estabelecida na Convenção de Viena das Nações Unidas sobre substância psicotrópicas em 1971, integrando o ordenamento jurídico brasileiro por meio do Decreto 79388/77.

Destaca-se que, qualquer pessoa poderá ser SUJEITO ATIVO do crime previsto no artigo 33 da lei 113434/06; e será considerado SUJEITO PASSIVO, a coletividade. Trata-se, portanto, de um crime comum (exceção feita à figura “prescrever”, uma vez que, somente médico e dentista podem fazê-lo, logo, nesta figura o crime é próprio), como também, um crime vago (tendo em vista ser o sujeito passivo uma entidade despersonalizada). Aliás, se o sujeito ativo praticar o crime prevalecendo-se de função pública ou no desempenho de missão de educação, poder familiar, guarda ou vigilância; a pena será aumentada de um sexto a dois terços (artigo 40).

Outrossim, o OBJETO MATERIAL da lei 113434/06 é a DROGA, ou seja, substância ou produto capazes de causar dependência física ou psíquica, assim relacionadas em lei ou lista atualizada periodicamente pelo Poder Executivo. Hoje, a regulamentação está na portaria 344 do Ministério da Saúde – ANVISA. Dessume-se, pois, que a lei 113434/06 é uma NORMA PENAL EM BRANCO, necessitando de complementação para sua tipificação.

Ressalta-se ademais que, o artigo 33 da lei 11343/06, trata-se de um TIPO MISTO ALATERNATIVO, uma vez que, possui várias condutas dentro de seu tipo legal (18 condutas). Fato esse que, guarda estreita relação com a CONSUMAÇÃO e a TENTATIVA do crime. Isso porque, de acordo com a TEORIA OBJETIVA FORMAL, a consumação do delito existirá quando o núcleo do tipo tiver sido praticado pelo agente. Sendo assim, por ter o artigo 33 da lei 11343/06 dezoito núcleos típicos, dificilmente ter-se-á tentativa desse delito, pois, alguma conduta antecedente já terá infringido alguma ação nuclear. Infere-se, portanto, ser pouco provável, mas não impossível, a tentativa desse delito.

Ainda mais, o artigo 33 da Lei 11343/06 é um CRIME DE MERA CONDUTA, também chamado de crime de simples atividade, pois, o tipo penal se limitou a descrever a conduta criminosa, não contendo nenhum resultado naturalístico. Ademais, é um CRIME DE PERIGO ABSTRATO, conhecido também por crime de simples desobediência, conforme já reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal, isso porque, tal crime, consuma-se com a prática da conduta criminosa, não se exigindo a comprovação da produção da situação de perigo, havendo, assim, uma presunção absoluta de que os núcleos do tipo penal acarretam perigo ao bem jurídico protegido pela norma.

No mais, matéria afeta à classificação do artigo 33 da lei 11343/06 como sendo ele um tipo misto alternativo, está ligada a UNIDADE DELITUOSA e ao CONCURSO DE CRIMES. Assim, se o agente, no mesmo contexto fático de sua conduta, realiza mais de uma ação nuclear típica, ter-se-á crime único, tendo em vista que, esse CONFLITO APARENTE DENTRO DA NORMA é solucionado pelo PRINCÍPIO DA ALTERNATIVIDADE. Todavia, se o agente desencadeia condutas em contextos fáticos diversos, estar-se-á diante do CONCURSO DE CRIMES, devendo seguir as regras do artigo 69 do Código Penal. Por oportuno, ressalta-se que, o tráfico de drogas poderá caracterizar o crime da lei 9613/98 (“lavagem de dinheiro”).

Urge salientar ainda que, por ser pouco provável a tentativa do crime do artigo 33 da lei 11343/06, a prisão em flagrante por policial que simular ser comprador da droga, é certamente legal, porque, condutas anteriores (por exemplo, ter em depósito, transportar, trazer consigo; que, aliás, são condutas permanentes), já fazem o crime ser consumado, logo, passível de prisão em flagrante (na mesma linha de raciocínio, advirta-se que, há também condutas instantâneas, como por exemplo: importar, exportar, preparar, etc.).

Destaque também deve ser dado à proibição de liberdade provisória a quem houver infringido o artigo 33 da lei 11343/06, mesmo que tenha havido permissão aos crimes hediondos conforme lei 11464/06, isso porque, o artigo 33 é equiparado a hediondo sendo regido por comando próprio – PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE (artigo 44 da lei 11343/06). Ademais, conforme entendimento dos Tribunais, o magistrado nem deve fazer combinações de leis (“Lex tertia”) entre a,lei 6368/76 e a lei 11343/06 para beneficiar o agente (“Lex mitior” e “Lex gravior”) uma vez que, não é sua competência legislar. Todavia, a jurisprudência é oscilante, vindo a admitir liberdade provisória, justificando-se no sentido de ser a lei 11464/06 mais benéfica ao réu (princípio do favor rei) e ulterior à lei 11343/06 (critério cronológico).
Conclui-se que o Estado Democrático Brasileiro, reprime severamente o tráfico ilícito de drogas, tendo em vista o mandado de criminalização estabelecido no artigo 5º inciso XLIII da Constituição Federal, atendido pela lei 11343/06 (artigo 33). Aliás, fato esse corroborado ainda mais pela Lei Maior que autoriza a expropriação de glebas onde forem localizadas culturas ilegais de plantas psicotrópicas (artigo 243); e ainda, pela possibilidade de extradição do brasileiro naturalizado envolvido com tráfico de drogas (artigo 5º, inciso LI).