terça-feira, 22 de janeiro de 2013

PRAZO DE ENCERRAMENTO DO INQUÉRITO POLICIAL.

Reflexão:

PRAZO DE ENCERRAMENTO DO INQUÉRITO POLICIAL E A LEI 12.403/11.

O prazo de encerramento do inquérito policial encontra-se estabelecido como regra geral no artigo 10 do CPP, sendo o mesmo de 10 dias quando o indiciado estiver preso. Nesse sentido, chamamos o leitor para uma reflexão sobre tal prazo tendo em vista a alteração legislativa processual penal sofrida pela Lei 12.403/11 relacionado às modalidades de custódia cautelar privativas de liberdade.

Destarte, com o advento da Lei 12.403/11 a prisão em flagrante restou consolidada como "medida precautelar", visto que, conforme preceitua o artigo 310 do CPP, quando o juiz receber o auto de prisão em flagrante deverá fundamentadamente: relaxar o flagrante, converter em prisão preventiva, ou, conceder liberdade provisória. Sendo assim, podemos afirmar que, não se concebe na atual ordem jurídica existir prisão em flagrante como medida cautelar processual.

Diante de tal cenário jurídico, pergunta-se: "O que ocorre quando o prazo de 10 dias previsto no artigo 10 do CPP é desatendido e já houve a conversão da prisão em flagrante em prisão preventiva?"

Será que a resposta é: O indiciado será colocado em liberdade?!?!?

Nesse sentido, cremos que quatro interpretações devem ser estabelecidas para o artigo 10 do CPP quanto ao prazo de encerramento do inquérito policial para réu preso, quais sejam:

a) O artigo 10 do CPP restou derrogado quanto ao prazo de 10 dias, permanecendo somente o prazo de 30 dias, uma vez que, o prazo de 10 dias encontra-se estabelecido ao “indiciado” preso, logo, imanente ao inquérito policial, donde podemos estabelecer a mens legis do artigo 10 do CP, ou seja, imprimir uma real celeridade ao inquérito policial tendo em vista a situação do então custodiado cautelar, frise-se os termos da lei - indiciado - subtendendo ser o indivíduo preso em flagrante delito (interpretações gramatical, histórica e teleológica). Destarte, tendo em vista a lei 12.403/11 ter estabelecido a transfiguração da prisão em flagrante em prisão preventiva (se for o caso) concedendo assim aspectos judiciais cautelares processuais a tal situação (inteligência dos artigos 310 c/c 311 do CPP com nova redação estabelecida pela lei 12.403/11), entendemos pela derrogação do prazo de 10 dias.
Ressalta-se que nesta interpretação o prazo de encerramento do inquérito policial iniciado por prisão em flagrante (que se faz comunicado "imediatamente" ao Juiz e ao Ministério Público, sendo remetido os autos do flagrante em 24 horas ao Juiz, e se for o caso também ao Defensor Público - artigo 306 e parágrafo 1. do CPP) será de 30 dias e não mais de 10 dias porque não há mais fundamento de se impor celeridade desproporcional a uma medida cautelar jurisdicionalizada (conversão da prisão em flagrante em prisão preventiva) que não encontra prazo legal (leia-se, vigorará a prisão preventiva enquanto estiver presente os requisitos previstos no artigo 312 do CPP).

b) Ou então, podemos interpretar o artigo 10 do CPP em consonância com a lei 12.403/11, concedendo ao mesmo validade integral. Para tanto, forçoso é estabelecer que tal prazo de 10 dias ao indiciado preso passou a ser um requisito da prisão preventiva, ao lado dos requisitos estabelecidos no artigo 312 do CPP, o que denominamos de “requisito temporal preclusivo”, pois, caso o inquérito policial (que é iniciado pela prisão em flagrante, convertida em prisão preventiva) não esteja relatado em 10 dias, o preso cautelar será colocado em liberdade.

c) Há ainda a posição que entende permanecer em vigor integral o artigo 10 do CPP onde então o prazo de 10 dias deve ser respeitado, considerando o mesmo como sendo um “prazo próprio”, cujo descumprimento consubstancia coação ilegal, passível de revogação da prisão. Tal posição encontrava-se pacífica antes do advento da lei 12.403/11, visto que, a prisão em flagrante era compreendida como sendo uma medida cautelar privativa da liberdade do indivíduo extrajudicial (o juiz somente analisa os requisitos formais da prisão em flagrante, mantendo-a ou não).

d) De outro lado, há ainda a posição de se manter integralmente o artigo 10 do CPP, logo, o prazo de 10 dias para encerrar o inquérito policial deve ser atendido, contudo, tendo em vista a transfiguração da prisão em flagrante em prisão preventiva (lei 12.403/11 – artigo 310 do CPP), o prazo dos 10 dias é tido como “prazo impróprio”, logo, eventual descumprimento do mesmo, não acarretaria a revogação da prisão preventiva, que ficará adstrita à análise do caso concreto de seus requisitos. Destarte, o prazo de 10 dias para ofertar relatório final, por tratar-se de prazo impróprio, constituirá uma irregularidade não causando no processo qualquer nulidade. Aliás, a desídia da Autoridade Policial analisada na esfera administrativa e criminal (crime de prevaricação).

Dentro das perspectivas analisadas, ainda fazemos duas indagações para reflexão:

1. Como conciliar a determinação do artigo 10 do CPP com a conversão da prisão em flagrante delito em prisão preventiva (conforme novo cenário criado pela lei 12.403/11) e prosseguimento nos demais atos de polícia judiciária?

2. Quem é a Autoridade coatora no caso de descumprimento do prazo estabelecido no artigo 10 do CPP se a prisão em flagrante foi convertida em prisão preventiva?

Para tais indagações deixaremos que você responda caro leitor. Certo é que, para cada interpretação apresentada acima, teremos o desenvolvimento de respostas as indagações feitas aqui.

Enfim, essas são as considerações/reflexões interpretativas que fazemos relacionado ao prazo de encerramento do inquérito policial previsto como regra no artigo 10 do CPP tendo em vista a alteração legislativa estabelecida pela lei 12.403/11; sendo certo que estas linhas escritas tem a finalidade de provocar no leitor o debate sadio que só tem a engrandecer nossa vida (pessoal e profissional), fazendo com que esqueçamos, nestas oportunidades de estudos, as mazelas e abnegações que vivemos e encontramos nos caminhos que percorremos. Fato é que, ninguém em terra poderá nos tolher dos ensinamentos adquiridos! Viva o estudo! Viva o debate acadêmico!

Autor: Jaime Pimentel Júnior.
Delegado de Polícia em São Paulo;
Pós-graduado em Direito Público e Privado;
 Professor concursado da ACADEPOL/SP.

terça-feira, 1 de janeiro de 2013

SANTO AGOSTINHO

Reminiscência em Santo Agostinho e a Doutrina Platônica

(por Ândrea Cristina Pimentel Palazzolo)

Não obstante os preconceitos que recaem sobre o pensamento medieval, os manuais de filosofia são unânimes em apresentar Santo Agostinho (Aurélio Agostinho/ Tagaste -354/ Hipona - 430, atual Argélia/África do Norte) como o grande sintetizador do mundo antigo. Bispo, Escritor, Filósofo, Teólogo, Padre latino e Doutor da Igreja Católica que, ao fazer uma junção harmônica entre o pensamento greco-romano (filosofia) e o judaico-cristão (fé), preparou as bases de uma nova cultura que se tornaria hegemônica no decorrer dos tempos, o que leva alguns autores a chamá-lo de “pai do Ocidente”.

A meditação sobre a memória (liv. X) tornou-se texto de “antologia” filosófica, é lido com demasiada freqüência fora do contexto, com risco de não ser compreendida, pois não é digressão, mas exercício espiritual. A exploração da memória não passa de etapa de um “itinerário do espírito rumo a Deus”. O trajeto começa pelo percurso do mundo exterior: o espírito convertido interroga todas as criaturas e ouve sua resposta, porque ao ouvir a voz delas de fora, compara-as à Verdade de dentro. O movimento de transcendência prossegue no mundo interior, a exploração do surpreendente conteúdo da memória as imagens das percepções, as lembranças das ações passadas, o saber e seus princípios, os números, mas também as lembranças das paixões da alma, e mesmo do esquecimento; pois a mulher que perdera uma drácma, se não tivesse lembrado dela, não a teria encontrado nem mesmo procurado. Tudo isso faz parte do treinamento do espírito, pois cumpre tão somente chegar até Deus. “Senhor do espírito”. “Onde então te encontrei, para te conhecer, senão em Ti acima de mim”. É um exercício que Agostinho faz com freqüência, explica, e “em que se deleita”.

Para explicar como é possível ao homem receber de Deus o conhecimento das verdades eternas. Agostinho elabora a doutrina da iluminação divina. Trata-se de uma metáfora recebida de Platão, que na célebre alegoria da caverna, mostra ser o conhecimento, em última instância, o resultado do bem, considerado como um sol que ilumina o mundo inteligível. Agostinho louva os platônicos por ensinarem que o princípio espiritual de todas as coisas é, ao mesmo tempo, causa de sua própria existência, luz de seu conhecimento e regra de sua vida. Por conseguinte, para ele, todas as proposições que se percebem como verdadeiras seriam tais porque previamente iluminadas pela luz divina.

Ao afirmar esse saber prévio. Agostinho aproxima-se da doutrina platônica, segundo a qual todo conhecimento é reminiscência. Assim é no âmbito da inteligibilidade que Agostinho se aproxima da teoria platônica da Reminiscência.

A Reminiscência platônica, ou a anamnésis é a ação de recordar, ou trazer à mente o conhecimento que é inerente à psique humana e que precisa ser lembrada pela reflexão filosófica. Agostinho identifica na "teoria das idéias" de Platão o universo das "idéias divinas". Tais idéias divinas, os homens as recebem de Deus através da iluminação, e, com isso o conhecimento das verdades eternas.

Não obstante as evidentes ligações entre os dois pensadores, Agostinho afasta-se, porém, de Platão ao entender a percepção do inteligível na alma não como descoberta de um conteúdo passado, mas como irradiação divina no presente. A alma não passaria por uma existência anterior, na qual contempla as idéias, ao contrário, existiria uma luz eterna da razão que procede de Deus e atuaria em todo momento possibilitando o conhecimento das verdades eternas. Então como os objetos exteriores só podem ser vistos quando iluminados pela luz do Sol, também as verdades da sabedoria precisariam ser iluminadas pela luz divina para se tornarem inteligíveis.

A iluminação divina, contudo, não dispensa o homem de ter um intelecto próprio, ao contrário, supõe sua existência. Deus não substitui o intelecto quando o homem pensa o verdadeiro, a iluminação teria apenas a função de tornar o intelecto capaz de pensar corretamente em virtude de uma ordem natural estabelecida por Deus.

Agostinho não rejeita o conhecimento proveniente das sensações, mas o coloca em um patamar inferior, entendendo o intelecto como superior, mas sendo ambos fontes de conhecimento. É na realidade uma re-interpretação do platonismo. Para ele, assim como para a visão a luz (física) exerce papel fundamental, sem a qual não haveria conhecimento dos objetos sensíveis, do mesmo modo para o conhecimento intelectual é necessário uma luz espiritual, esta, no entanto, proveniente de Deus.

Se para Platão o conhecimento é o resultado de uma reflexão dialética, de uma ascese espiritual, para Agostinho é pura graça divina, não negando o caráter filosófico que é a reflexão. A graça divina por sua vez, é alcançada por uma vida de piedade e de temor a Deus. Atingir essa iluminação não é tarefa para todos os homens, mas sim para aqueles que se voltam a Deus e recebe Cristo como o mediador desse processo. Embora essa mediação tenha sido afetada pelo pecado original, ela não foi de completamente anulada.

Agostinho interpretando o Apóstolo Paulo, é a graça divina que auxilia o homem em sua ascensão ao mundo espiritual, onde ele pode ter contato com os entes do conhecimento puro.

A teoria Agostiniana estabelece assim, que todo conhecimento verdadeiro é o resultado de um processo de iluminação divina que possibilita ao homem contemplar as idéias, arquétipos eternos de toda a realidade. Nesse tipo de conhecimento a própria luz divina não é vista, mas serve apenas para iluminar as idéias.

"Quem conhece a verdade, conhece esta luz, e quem a conhece, conhece a Eternidade". (Santo Agostinho)

Sobre a vida de Santo Agostino convido-os a assistir o Filme de Roberto Rossellini, “Santo Agostinho”, disponível no youtube: www.youtube.com .

Bibliografias consultadas:

Os Pensadores, História das Grandes Idéias do Mundo Ocidental, vol.I, Editor Victor Civita – 1972

Os Filósofos – Clássicos da Filosofia – Rossano Pecoraro (org) – vol. I – de Sócrates a Rousseau – editora Vozes – 2008.

Dicionário dos Filósofos – Denis Huisman – Martins Fontes – São Paulo 2004