sexta-feira, 3 de outubro de 2014

BUDISMO

BUDISMO
( por Ândrea Cristina Pimentel Palazzolo)

 

Resumo: Este artigo pretende discorrer sobre: “Buda”, “O Budismo”, “ As quatro verdades nobre” e “O caminho Óctuplo”, a partir do texto de Huston Smith. 

 

I – Sobre Buda

 

O Budismo começa com um homem que despertou. Em seus últimos anos de vida, quando a Índia se incendiava com sua mensagem e até reis vinham prostrar-se diante dele. A raiz sânscrita ‘budh” denota tanto o despertar quando o saber. Buda significa o “iluminado” ou o “desperto”.  O budismo começa com um homem que sacudiu fora o atordoamento, o torpor, os devaneios oníricos da percepção consciente comum.

 

Buda nasceu por volta de 563 a. C. na região que é hoje o Nepal . Seu nome era Sidarta Gautama, dos Sakyas. Seu pai era um rei. Casou-se aos 16 anos com uma princesa que lhe deu um filho chamado Rahula.

Por volta dos 20 anos, desceu sobre ele um descontentamento que levaria à ruptura completa com sua situação mundana. Decidiu seguir a vocação de buscador da verdade. Certa noite, aos 29 anos, ele cortou todos os laços com o passado.

 

Seguiu-se quase meio século, durante o qual Buda percorreu as estradas poeirentas da Índia até seus cabelos embranquecerem, seu passo perder a firmeza e seu corpo nada mais ser que um frágil envoltório, pregando sua redentora mensagem de anulação do ego. ‘ A ele vinham as pessoas, atravessando o país desde terras distantes, para fazer perguntas, e a todas ele dava as boas-vindas.” Havia, na verdade, uma simplicidade surpreendente naquele homem diante de quem os reis se curvavam.

 

Apesar de sua objetividade em relação a si mesmo, havia constante pressão, durante sua vida, para transformá-lo em um deus. Buda rejeitou categoricamente.

 

 

 

II - O Budismo

 

Ao passarmos de Buda, o homem, para o budismo, a religião, é imperativo observar esta última contra o pano de fundo do hinduísmo a partir do qual ela cresceu.  Ao contrário do hinduísmo, que surgiu por adição espiritual lenta e em grande parte imperceptível, a religião de Buda surgiu da noite para o dia, totalmente formada. O budismo extraiu seu sangue vital do hinduísmo; mas, contra as corrupções reinantes no hinduísmo, o budismo recuou como um chicote e contra-atacou – duramente.

 

Buda pregou uma religião: 1) desprovida de autoridade; 2) desprovida de rituais; 3) que contornava a especulação; 4) desprovida de tradição; 5) de grande esforço pessoal; 6) desprovida do sobrenatural.

           

O budismo original nos apresenta uma versão da religião que é única.

 

O budismo original pode ser caracterizado nos seguintes termos:

 

1) era empírico:  em todas as questões , a experiência pessoal era o principal teste da verdade.

 2) era científico:  dirigia a atenção para a descoberta das relações de causa e efeito que afetavam a experiência. Não há efeito sem a sua causa.

 3) era Pragmático: um pragmatismo transcendental, se preocupando com a solução dos problemas.

 4) era terapêutico: as palavras de Pasteur “ Não te pergunto qual a tua opinião, nem qual a tua religião; pergunto, que estás sofrendo?”, bem poderiam ser de Buda.

 5) era psicológico: Buda começava com o destino humano, seus problemas e a dinâmica do seu enfrentamento.

 6) era igualitário: insistia que as mulheres eram tão capazes de alcançar a iluminação quanto os homens. Buda rompeu com o sistema de castas e abriu sua ordem a todos.

7) era dirigido às pessoas: Buda não era cego ao lado social da natureza humana. Seu apelo, no fim, foi dirigido ao indivíduo e suas próprias dificuldades.

 

 

 

III- As Quatro Nobres Verdades:

 

A maioria das pessoas provavelmente vacilaria se solicitada a listar, na forma de proposições, suas quatro convicções mais importantes sobre a vida. As Quatro Nobres Verdades constituem a resposta de Buda a esse pedido. Juntas, elas surgem como os axiomas de seu sistema, os postulados dos quais deriva logicamente o restante de seus ensinamentos.

 

A Primeira Nobre Verdade é que a vida é “dukkha”, traduzido geralmente como “sofrimento”. Embora longe de ser seu significado total, o sofrimento é parte importante desse significado.

           

Mesmo Albert Schweitzer, que considerava a India pessimista, repetiu a avaliação de Buda quase ao pé da letra quando escreveu: “ Somente em alguns raros momentos senti-me realmente feliz por estar vivo. Eu não conseguia deixar de sentir, com uma compaixão cheia de remorso, toda a dor que via à minha volta, não só a dor humana, mas a dor de toda a criação.”

 

Dukka, portanto, designa a dor que , até certo ponto, matiza toda a existência finita. As implicações construtivas dessa palavra vêm à luz quando descobrimos que era usada, na língua páli, para indicar a roda cujos eixos estivessem fora de centro ou um osso que tivesse saído da articulação. ( Uma metáfora moderna seria o carrinho de supermercado que alguém tenta conduzir segurando-o no lado oposto ao pegador.)

 

O significado exato da Primeira Nobre Verdade é este: a Vida ( no estado em que ela se colocou) está deslocada. Algo saiu errado. Ela se desarticulou. Com sua base não é genuína, a fricção (conflito interpessoal) é excessiva, o movimento ( criatividade) é bloqueado, e ela causa dor.

 

Com sua mente analítica, Buda não se contentou em deixar a Primeira Verdade nessa forma generalizada. Prosseguindo, ele apontou seis momentos nos quais o deslocamento da vida se torna flagrantemente evidente. Ricos ou pobres, medianos ou talentosos, todos os seres humanos experimentam:

 

1) O trauma do nascimento.

2) A patologia da doença.

3) A morbidez da decrepitude.

4) A fobia da morte.

5) Sujeição àquilo de que não gostam.

6) Separação daquilo que amam.

 

Ninguém nega que os sapatos da vida apertam nesses seis lugares. A Primeira Nobre Verdade os une, concluindo que os cinco “skandas”( componentes da vida) são dolorosos. Como esses “skandas” são o corpo, as sensações, os pensamentos, os sentimentos e a consciência, em suma, tudo aquilo que geralmente consideramos ser a vida, isso equivale a dizer que a totalidade da vida humana ( tal como a vivemos) é sofrimento. De algum modo, a vida se apartou da realidade, e essa separação, enquanto não for superada, torna impossível a verdadeira felicidade.

 

Para a brecha ser sanada, precisamos conhecer sua causa.

 

A segunda Nobre Verdade a identifica. A causa do deslocamento da vida é” tanha”. Mais uma vez as imprecisões da tradução. Tanha geralmente é traduzido como “desejo”.

“Tanha” é um tipo específico de desejo, o desejo de realização individual. Longe de ser a porta da vida abundante, o ego é uma hérnia estrangulada. Quanto mais ela incha, mais sufoca a livre circulação da qual depende a saúde, e mais a dor aumenta.

           

A Terceira Nobre Verdade é a sequência lógica da Segunda. Se a causa do deslocamento da vida é a ânsia egoísta, então sua cura está na superação dessa ânsia. Se conseguíssemos nos libertar dos limites estreitos do egoísmo, passando para a imensidão da vida universal, ficaríamos livres do nosso tormento.

 

A Quarta Nobre Verdade prescreve como a cura pode ser realizada. A superação de “tanha”, o caminho para fora do cativeiro, se dá por meio do Caminho Óctuplo.

  

IV- O Caminho Óctuplo

 

O Caminho Óctuplo, portanto, é uma rota de tratamento. É o tratamento por meio de treinamento. Buda distinguia duas maneiras de viver. Uma delas é a maneira aleatória e irrefletida, na qual o sujeito é puxado e empurrado por impulsos e circunstâncias, como um graveto na tempestade. A segunda, a vida com um propósito, ele chamava  de Caminho. Buda propôs uma série de mudanças destinadas a libertar o indivíduo da ignorância, do impulso inconsciente e de “tanha”.

Por meio de longa e paciente disciplina, o Caminho Óctuplo pretende nada menos que apanhar a pessoa, onde ela estiver, e assentá-la como ser humano diferente, curado das deficiências que o aleijavam.

           

“Felicidade, aquele que busca conquistará”, disse Buda, “ se praticar”.

           

O que é essa prática de que fala Buda?

 

Ele a divide em oito passos. Estes, porém, são precedidos por um passo preliminar. Este  passo  preliminar é a associação correta. Devemos nos associar aos que conquistaram a Verdade, conversar com eles, servi-los, observar seus caminhos e absorver, por osmose, seu espírito de amor e compaixão.

 

Exposto esse passo preliminar, segue os oito passos do Caminho:

 

1) Visão Correta – alguma orientação intelectual, é necessária se a pessoa pretende pôr-se a caminho de outra maneira que não seja ao azar. As Quatro Nobres Verdades oferecem essa orientação. O sofrimento é abundante; é ocasionado pelo impulso para a realização individual; esse impulso pode ser moderação; e a maneira de moderá-lo é percorrer o Caminho Óctuplo.

 

2) Intenção Correta – enquanto o primeiro passo convocou nossa mente a considerar qual é basicamente o problema da vida, o segundo passo convoca nosso coração a decidir o que realmente queremos.

3) Linguagem correta – Nossa primeira tarefa é tomar consciência do nosso discurso e daquilo que ele revela sobre o nosso caráter. A segunda direção a ser tomada pela nossa linguagem é o rumo da caridade.

 

4) Conduta Correta – o treinamento deve refletir sobre suas ações. Com respeito à direção na qual deve prosseguir a mudança, o conselho mais uma vez é: rumo ao altruísmo e à caridade. Essas diretrizes gerais são detalhadas nos Cinco Preceitos, a versão budista da segunda metade, ou metade ética, dos Dez Mandamentos: a) Não matar, b) Não roubar, c) Não mentir, d) Não ser incasto e e) não consumir bebidas alcoólicas.

 

5) Ocupação Correta – os ensinamentos explícitos de Buda sobre  o trabalho visavam ajudar seus contemporâneos a decidir entre as ocupações que levavam ao progresso espiritual e as que o impediam, há budistas que sugerem que, se Buda ensinasse hoje, ele se preocuparia menos com aspectos específicos e mais com o perigo de as pessoas esquecerem que ganhar o sustento é um meio, não o principal objetivo da vida.

 

6) Esforço Correto -  Buda dava imensa ênfase  à vontade. Alcançar a meta exige um tremendo esforço; há virtudes a desenvolver, paixões a refrear e estados mentais destrutivos a apagar, para que a compaixão e o desapego tenham a oportunidade de surgir.

 

7) Atenção Correta – Se conseguíssemos realmente compreender a vida, se pudéssemos compreender realmente a nós mesmos, perceberíamos que nem uma nem outra são problemas.

 

8) Concentração Correta – este passo envolve substancialmente as técnicas que já encontramos na “raja yoga” hinduísta, e leva substancialmente à mesma meta.

 

 

Referências:

 

1) Anotações de classe;

2) Smith, Huston. As Religiões do Mundo, Ed. Pensamento Cultrix.