SOBRE
NIETZSCHE
(por Ândrea Cristina Pimentel Palazzolo)
Resumo: Este
artigo oferece um breve resumo sobre a biografia de Nietzsche.
“Há palavras
em mim que ainda cortam o coração de um Deus, sou um rendez-vous de experiências,
que só se dão a seis mil pés acima de qualquer atmosfera humana…” (Nietzsche)
Friedrich
Wilhelm Nietzsche morre em Weimar ao meio-dia de 25 de agosto de 1900. Alheio
ao que ocorre à sua volta, ele passa os 10 últimos anos de vida sob a tutela da
mãe e, depois, da irmã. Uma vida de errança, sofrimento, solidão.
Nietzsche
nascera numa família de pastores protestantes. Em 1858, aos 14 anos, ingressara
como bolsista no Colégio Real de Pforta, renomada instituição de ensino.
Dedicara grande parte do tempo ao estudo da teologia; queria ser pastor como o
pai. Mas era sobretudo pela música e pela poesia que se sentia atraído. Começara
a escrever e compor. Ao terminar os estudos secundários, em setembro de 1864,
escolheu especializar-se em filologia clássica. E, em 1869, foi nomeado
professor na Universidade da Basiléia, na Suíça. Passou então a frequentar o teólogo
Franz Overbeck, o historiador Jack Burckhardt e o compositor Richard Wagner.
Seu primeiro
livro, O nascimento da tragédia no espírito da música, publicado em
janeiro de 1872, embora bem acolhido nos círculos wagnerianos, provocou o
constrangimento dos filólogos e foi objeto de severas críticas. Na verdade ,
ele já testemunhava o interesse de seu autor pelas questões filosóficas. Se a Primeira
consideração extemporânea teve alguma repercussão em 1873, com artigos e
resenhas publicados nos jornais de Augsburgo e Leipzig, a Segunda e a Terceira,
em 1874, passaram quase desapercebidas e, em 1876, a Quarta, Richard Wagner
em Bayreuth, foi celebrada apenas pelos que se achavam ligados ao
compositor.
Em 1879, Nietzsche atinge o ponto mais
baixo de sua vitalidade. Seu estado de saúde é desesperador. Atravessa mais de
70 horas de dores ininterruptas, mais de 118 dias de crises graves. Problemas
estomacais, náuseas e vômitos o retêm na cama, dores na vista interferem no seu
ritmo diário, insônias frequentes desorganizam o seu cotidiano, violentas
enxaquecas lançam em profunda prostração. Apesar disso, escreve. No ano
anterior, reunindo as suas notas, folhas e folhas cobertas de reflexões sobre
diversos temas sem nenhum elo aparente, publicara Humano, demasiado humano. Pensara nos enciclopedistas - Voltaire,
Diderot - e na sua aversão pelos sistemas filosóficos acabados. Lembrara-se dos
moralistas - Chamfort, La Rochefoucauld- e de suas máximas e pensamentos.
Agora, adotando ainda o estilo aforismático, elabora dois apêndices ao livro Miscelânea
de opiniões e sentenças e O andarilho e sua sombra.
No mês de maio de 1879, ele apresenta
a sua carta de demissão à Universidade da Basiléia. Graças ao empenho de
Overbeck, a municipalidade, a “sociedade acadêmica”e a universidade se cotizam
e lhe concedem uma pensão anual pelos serviços prestados. É o quanto lhe basta
para viver modestamente até o fim de seus dias. Doente, abraça então uma vida
errante.
Para onde ir? - é a pergunta que se
fará inúmeras vezes nos anos seguintes. Em nenhuma parte se deixará reter por
mais de seis meses. Percorrerá as estradas da Suíça, Itália, França e Alemanha;
sonhará com lugares mais distantes, “horizontes mais longínquos”. Em fevereiro
de 1881, conclui um novo livro Aurora. Um ano depois, mais um: A gaia
ciência. Aurora e A gaia ciência, como Humano, demasiado humano e
seus dois apêndices, só encontrarão respostas em cartas de amigos -
entusiasmadas, embaraçadas, consternadas.
Nietzsche não se habitua à solidão;
ela lhe pesa e talvez lhe fosse indispensável. Em Roma, numa manhã de abril de
1882, encontra Lou Andreas-Salomé. Aos 37 anos apaixona-se. Mas todos parecem
conspirar contra a sua paixão. A família empenha-se em denegrir “a jovem russa”;
insinua que seu comportamento não é dos mais convenientes e suas atitudes
chegam a ser debochadas. Mal-entendidos, intrigas, trocas de injúrias, calúnias.
Arrastado por sentimentos contraditórios, ele não sabe em quem confiar. Em
dezembro, rompe com Lou e interrompe a correspondência com a mãe e a irmã.
Ideias de suicídio perseguem-no; por três vezes, toma uma quantidade abusiva de
narcóticos.
Mas, logo em janeiro de 1883, num
vilarejo da riviera italiana chamado Portofino, Nietzsche cria a primeira parte
de Assim falava Zarathustra - Um livro para todos e para ninguém em 10
dias. Em julho do mesmo ano, escreverá a segunda parte em Sils Maria, também em
10 dias. E apenas 10 dias serão suficientes, em Nice, para redigir, em janeiro
de 1884, a terceira. Um ano depois, nessa cidade, virá a elaborar em 10 dias a
quarta e última parte do livro. Para publicá-lo, tem de enfrentar vários obstáculos.
A primeira parte leva meses para aparecer. Schmeitzner, seu editor, cumpre sem
pressa o contrato com um autor malsucedido, dando prioridade à impressão de cânticos
religiosos e brochuras anti-semitas. Aceita ainda editar, juntas a segunda e a
terceira partes, mas diante da quarta mostra-se intransigente em sua recusa.
Depois de tentativas humilhantes e estéreis, o autor custeia uma tiragem de 40
exemplares. É mais do que suficiente: não chega a 10 o número de pessoas a quem
pensa enviá-los.
Veneza, Sils Maria, Naumburgo,
Leipzig, Munique, Florença, Gênova, Nice. De um ponto a outro, Nietzsche expede
a mala de 100 quilos, com livros e manuscritos. Por vezes, sem saber o que
fazer, deixa-a durante dias no guarda-volumes; no bolso, o recibo de todos os
seus pertences. De quando em quando, chegam-lhe pacotes de livros enviados por
Overbeck; o amigo conhece suas dificuldades financeiras. Numa ou noutra cidade,
detém-se para trabalhar nas bibliotecas públicas. Há muito, sente-se atraído
pelas ciências naturais e biológicas. Ainda na Basiléira, começara suas leituras
em física e química. Em 1873, entusiasmara-se pelas ideias do astrônomo e matemático
Boscovich. A partir de então, familiarizara-se com a física moderna - Vogt e
Zoellner, com a biologia - Roux e Rolph, com a psicologia francesa - Ribot e
Espinas, sem falar nos recentes estudos etnográficos.
Em 1886, Nietzsche acaba por elaborar
um novo livro, Para além de bem e mal, que pensa publicar por sua própria
conta. Desde que Schemeitzner se negara a imprimir a quarta parte de Assim
falava Zarathustra, ele está às voltas com editores; todos se recusavam a
publicar os seus livros. Por fim, Fritzsch, o editor de Wagner, assume a
publicação das suas obras. Nietzsche lhe envia, então, os prefácios às novas
edições de O nascimento da tragédia, do primeiro e do segundo volumes de
Humano, demasiado humano, de Aurora e de A gaia ciência, assim como a quinta
parte deste último livro. A ele encaminhará todos os seus escritos posteriores,
a começar pela Genealogia da moral, que redige em 1887.
É por essa época que Nietzsche descobre
Dostoievski, deixando-se fascinar pela fina análise psicológica que ele faz do
criminoso. Em 1879, descobrira Stendhal, ficando encantado com suas palavras: “entro
na sociedade por um duelo”. Com esses autores, busca cumplicidades. Há tempo,
se sente abandonado: nem discípulos, nem leitores. Há tempo, percorre ansioso
as livrarias; talvez tenha sido publicado algum artigo ou resenha sobre os seus
próprios livros. Nada encontra. Seu estado de saúde se agrava.
Em 1888, um de seus anos mais fecundos
no que concerne à atividade intelectual, escreve O caso Wagner, Crepúsculo
dos ídolos, O anticristo, Ecce homo e elabora Nietzsche contra Wagner
e Ditirambos de Dionísio. Sua Saúde se depaupera ainda mais.
Contudo, Nietzsche começa a fazer-se
conhecer. Georg Brandes, professor de literatura comparada na Universidade de
Copenhague, relata-lhe o sucesso das conferências sobre sua filosofia. August
Strindberg, escritor sueco, participa-lhe a emoção causada pela virulência de
suas palavras e coragem de suas ideias. Hippolyte Taine, crítico e historiador
da arte francês, sugere-lhe tradutores para a edição francesa do Crepúsculo
dos ídolos. Artigos polêmicos aparecem em jornais da Alemanha e da Suíça a
propósito de seus livros. De São Petersburgo e de Nova Iorque chegam-lhe as
primeiras cartas de admiradores de sua obra.
E assim Nietzsche faz planos e inicia
contatos para assegurar a tradução de seus escritos. Quer editar o Ecce homo
em 1889 e, daí a dois anos, lançar O anticristo em sete línguas
simultaneamente. Nos últimos dias de dezembro de 1888, em Turim, uma forte tensão
psíquica o leva a mergulhar no delírio.
Referência
Marton, S., Nietzsche; Os Filósofos Clássicos da
Filosofia; Petrópolis-RJ; Ed.Vozes; 2008.