terça-feira, 24 de novembro de 2009

TUTELAS ESPECÍFICAS NO PROCESSO CIVIL.

Faremos um estudo sobre as TUTELAS JURISDICIONAIS ESPECÍFICAS NO PROCESSO CIVIL, utilizando para tanto os ensinamentos de FREDIE DIDIER JR. e LUIZ GUILHERME MARINONI.

Nesse sentido, os autores nos ensinam que, para uma melhor compreensão da matéria, salutar faz-se a DISTINÇÃO ENTRE ILÍCITO E DANO, isso porque, é exatamente nessa distinção que teremos o enquadramento das tutelas jurisdicionais específicas.

Destarte, Fredie Didier assim diferencia: “a prática de um ato contrário ao direito não implica necessariamente o surgimento de um dano, o que torna inconfundíveis os conceitos de ato ilícito e de dano. O ato ilícito é qualquer conduta contrária ao Direito (...) que pode gerar, ou não, um dano”. E exemplifica: “empresa mineradora que, mesmo expirada a sua autorização de funcionamento, continua operando, sem, contudo, causar qualquer tipo de dano. Há aí um ilícito que não gera dano”. E o autor continua diferenciando: “Já o dano é o prejuízo material ou moral que pode decorrer (i) da pratica de um ato ilícito (como, por exemplo, o descumprimento de uma cláusula contratual ou a violação de um dever legal), (ii) do exercício abusivo de um direito (como, por exemplo, a despedida indireta ou o abuso do direito de demandar, que gera o dano processual), que também é um ato ilícito, (iii) de um fato da natureza (como ocorreu em New Orleans, EUA, atingida pelo furacão Katrina) (iv) ou mesmo da prática de um ato ilícito (construção, pelo Estado, de um viaduto que passa em frente à janela de um determinado apartamento, reduzindo-lhe o valor de mercado em razão do desassossego causado)".

Aliás, Fredie Didier muito bem adverte que “o Direito Penal já há muito percebeu a diferença entre os institutos, tanto que distingue os chamados crimes de mera conduta (ex. omissão de socorro) dos crimes de resultado (ex. homicídio)”.

Ocorre que, por conta da não distinção entre ilícito e dano, nosso ordenamento processual civil ficou impregnado do dogma segundo o qual a ÚNICA FORMA DE PRESTAR A TUTELA CONTRA ATO ILÍCITO seria através da REPARAÇÃO DO DANO que eventualmente acontecesse (conhecida como TUTELA RESSARCITÓRIA ou de REPARAÇÃO DE DANO), denotando-se com isso que, NÃO SE BUSCAR EVITAR O DANO, MAS APENAS REPARÁ-LO ATRAVÉS DE SEU EQUIVALENTE EM PECÚNIA. Portanto, é exatamente por isso que a distinção acima feita é importante, ou seja, justamente para mostrar e demonstrar que, o ordenamento jurídico deve se imisquir nas relações jurídicas de forma a amparar àquele que dele se socorre, sem, para tanto, deixar que mal maior ocorra.

Dessa feita, os avanços doutrinários e legislativos fizeram com que fossem isoladas TUTELAS DIRIGIDAS CONTRA ILÍCITOS das TUTELAS DIRIGIDAS CONTRA O DANO, o que se convencionou chamar de TUTELAS ESPECÍFICAS, que assim encontram-se esquematizadas: 1. TUTELAS PREVENTIVAS (voltam-se contra o ilícito), formadas pela: 1.a) TUTELA PREVENTIVA EXECUTIVA, que é a TUTELA INIBITÓRIA COM TÉCNICA EXECUTIVA; e, 1.b) TUTELA INIBITÓRIA “STRICTO SENSU”, que é a TUTELA INIBITÓRIA COM TÉCNICA MANDAMENTAL; bem como, 2. TUTELAS REPRESSIVAS (voltam-se contra o ilícito ou contra o dano), formadas pela: 2.a) TUTELA REINTEGRATÓRIA (voltam-se contra o ilícito), que se subdivide em: 2.a.i) TUTELA DE REMOÇÃO DO ILÍCITO; e, 2.a.ii) TUTELA DO ADIMPLEMENTO CONTRATUAL; e, 2.b) TUTELA RESSARCITÓRIA (voltam-se contra o dano), que se subdivide em: 2.b.i) TUTELA RESSARCITÓRIA ESPECÍFICA “IN NATURA”; e, 2.b.ii) TUTELA RESSARCITÓRIA COM EQUIVALENTE EM DINHEIRO.

Nesses termos podemos dizer que a TUTELA INIBITÓRIA é uma tutela dirigida contra o ilícito visando impedir que ele ocorra. Trata-se, por isso, de uma TUTELA PREVENTIVA, encontrando respaldo no art. 5º, XXXV da CF que assegura o acesso a justiça em razão de “ameaça de violação do direito”. Exemplos: proibir jornal de veicular matéria onde se faz acusações de corrupção do filho de senador; ação de interdito proibitório; ação de nunciação de obra nova.
Posto isso, podemos estabelecer que, a tutela inibitória independe da alegação ou prova do DANO (mas deve-se comprovar a iminência do ilícito – ameaça de lesão); ademais, também independe da demonstração de CULPA, haja vista somente ser importante para fins de imputação da responsabilidade. Advirta-se porém que, para se conceder a tutela inibitória, dever-se-á restar comprovado a existência de fatores objetivos que conduzam a existência de ameaça de lesão a direito, não bastando receio subjetivo da prática do ilícito, tudo aferível diante da conduta (pretérita ou atual) do requerido.
Por último, ressalta-se que, a tutela inibitória poderá ser efetivada mediante TÉCNICA MANDAMENTAL, ou pela TÉCNICA EXECUTIVA (quanto a utilização desta técnica, Marinoni chama de TUTELA PREVENTIVA EXECUTIVA).

Por seu turno, a TUTELA REINTEGRATÓRIA ou também conhecida como TUTELA DE REMOÇÃO DO ILÍCITO (esta é a designação utilizada por Marinoni), volta-se contra o ilícito já praticado, pouco importando se há CULPA (já que isto servirá para fins de imputação da responsabilidade), bem como se há DANO.
Denota-se por isso que, sua finalidade é impedir que o ilícito continue sendo praticado, removendo-o, apagando-o, ou seja, fazendo-o desaparecer. Busca, portanto, a reintegração do direito violado, seja com o retorno ao estado da licitude antes vigente, seja com o firmamento do estado de licitude que deveria estar vigendo.
Vê-se que, trata-se de uma tutela repressiva, uma vez que, repita-se vez mais, volta-se contra o ilícito já consumado, todavia, não deixa de ser uma TUTELA PREVENTIVA INDIRETA, visto que, nos casos em que a ocorrência do ilícito ainda não gerou o dano, ela visará a impedir a consumação deste. Exemplo: alguém pede em juízo ordem que impeça a veiculação de filmes contendo cenas da vida privada (relação sexual dentro do mar, por exemplo) da pessoa; outro notório exemplo desse tipo de tutela é o que ocorre na ação de reintegração de posse; bem como, no pedido de retirada do nome da pessoa do cadastro de proteção creditícia (SPC e SERASA).

Na mesma guisa de raciocínio encontra-se a TUTELA DO ADIMPLEMENTO CONTRATUAL, considerada por Marinoni como uma classificação de tutela específica, mas, pelo professor Fredie Didier, como sendo, na verdade, uma espécie de tutela reintegratória, só que com a peculiaridade de incidir no ilícito contratual, qual seja, a remoção do inadimplemento de uma prestação pactuada em negocio jurídico. Nesse sentido, cumpre advertir que, tal tutela, volta-se contra a MORA RELATIVA, já que, se houver mora absoluta, ter-se-á o impedimento da prestação.

Por último, passemos em análise a TUTELA RESSARCITÓRIA, que outra coisa não é senão, uma tutela que voltada contra o DANO, sendo seu objetivo, promover a reparação do dano já causado. Trata-se, portanto, de uma TUTELA REPRESSIVA eis que dirigida contra o dano já causado. Advirta-se, contudo que, nem sempre o dano será resultado de um ato ilícito (por exemplo: legítima defesa que atinge terceiro inocente); como também, nem sempre haverá discussão de culpa do infrator (por exemplo: responsabilidade civil objetiva).
Ademais, cumpre enfatizar que, a tutela ressarcitória poderá ser: 1) PELO EQUIVALENTE EM PECÚNIA, que é aquela segundo a qual se atribui ao lesado o valor em dinheiro correspondente a diminuição patrimonial sofrida; e, 2) ESPECÍFICA, que é aquela segundo a qual se proporciona ao lesado o estabelecimento da situação que deveria estar vigendo acaso o dano não houvesse ocorrido, ou, ao menos, o resultado mais próximo deste (por exemplo: acidente de trabalho em que leva a amputação da perna do empregado e este como reparação específica pede que o empregador lhe entregue uma prótese; outro exemplo: veiculação de pedido público de desculpas nos casos de dano moral decorrente de ofensa à honra (desagravo público); mais um exemplo: reflorestamento nos casos de dano ambiental causado por desmatamento.).
Por fim, para enfatizar ainda mais a distinção existente entre dano e ilícito, corroborando com a escolha da melhor tutela jurisdicional para o caso concreto, temos evidente, nesse sentido, a distinção entre a TUTELA RESSARCITÓRIA ESPECÍFICA, que é aquela que visa a reparação do dano in natura ou através de um meio não-pecuniário; logo, volta-se contra o dano; da TUTELA REINTEGRATÓRIA ou DE REMOÇÃO DO ILÍCITO, que é aquela em que até poderá existir dano, contudo, seu principal objetivo é impedir que o ilícito continue existindo; logo, volta-se contra o ilícito.

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