sábado, 30 de outubro de 2010

ILICITUDE DE UMA GRAVAÇÃO CLANDESTINA.

DA ILICITUDE DA PROVA OBTIDA POR MEIO DE UMA GRAVAÇÃO (e não somente interceptação) CLANDESTINA.

Quando alguém mantém alguma espécie de comunicação com outrem, o conteúdo dessa comunicação, em princípio, não diz respeito a quem não seja dela participante, daí porque a ninguém é permitida a sua reprodução, por qualquer meio. A conversa situa-se no âmbito da privacidade e, por vezes, da intimidade, dos interlocutores, assegurado, portanto pela Lei Maior (art. 5º, X).

Nesse passo, as gravações clandestinas (aquelas desconhecidas por um dos interlocutores), data maxima venia, são evidentemente ilegais, razão pela qual, em princípio e como regra, configuram provas obtidas ilicitamente, pelo que serão inadmissíveis no processo (art. 5º, LVI , CF).

Contudo, advirta-se de pronto que, frequentemente encontramos jurisprudência, particularmente do STJ, no sentido de distinguir a gravação clandestina feita por um dos interlocutores sem o conhecimento do outro, daquela realizada por terceiros (a indigitada interceptação - art. 5º, XII da CF). Afirma-se que apenas estas seriam ilícitas.

Cabe porém alguns esclarecimentos, para que se entenda o que defendemos, leia-se, a inadimissibilidade da prova obtida por gravação, e não somente interceptação, clandestina, vejamos:

Quando um dos interlocutores promove a gravação da conversa sem o conhecimento do outro, a ilicitude não ocorrerá, efetivamente, do fato da gravação. E isso porque o conteúdo da conversa empreendida foi disponibilizado àquele interlocutor; Assim, porque conhecedor do conteúdo, não haveria problema na gravação feita por ele (isso aliás, é o que diferencia a ilicitude apriorística da interceptação clandestina, uma vez que, nesta, um terceiro "grava" a conversa dos interlocutores, sem o conhecimento destes - ilicitude da gravação e do conteúdo, por isso o rigor do art. 5º, XII da CF e seu regulamento na Lei 9.296/96 - Lei de interceptação telefônica.).

Denota-se assim que, no caso da gravação clandestina, a revelação daquele conteúdo poderá, em tese, afetar o direito à intimidade daquele interlocutor que desconhece a gravação. Nesse caso, embora lícita a gravação, a revelação de seu conteúdo poderia não sê-lo, afinal, o que ali teria sido dito se destinava somente aos interlocutores e a mais ninguém, pois realizada no âmbito da intimidade deles.

Portanto, no caso específico da gravação clandestina, o que irá determinar a ilicitude da prova não é o fato de ter sido realizada por "alguém" (terceiro ou por um dos interlocutores). Ao contrário, será o conteúdo então revelado que poderá afetar a intimidade do interlocutor que desconhece a gravação.

Evidentemente que, como já dito acima, a "gravação" clandestina feita por terceiros já é, ela mesma, ilícita, tendo em vista tratar-se de uma "interceptação" clandestina afrontosa à determinação do artigo 5º, XII da CF.

A título de encerramento, posto a situação dramática do direito constitucional à intimidade; outra situação, de igual ou quiçá, maior valor, também assegurada em bom tom pela Lei maior, ganha relevo, qual seja: o direito de não auto incriminar-se (direito ao silêncio) – principio do nemo tenetur se detegere – art. 5º,LXIII, CF. E o raciocínio a ser desenvolvido é o seguinte:

Se por exemplo, um dos interlocutores conseguisse gravar a confissão de um crime (diga-se, não sendo situação flagrancial ou qualquer outra justificadora da licitude de tal gravação– ex. estado de necessidade de um co-autor do crime), mesmo que tal situação seja louvável (posto sobre os olhos da ineficiência probatória investigativa do Estado), haveria violação do direito ao silêncio, porque a gravação teria obtido uma confissão extrajudicial, sem as exigências legais do Código de Processo Penal, inadmissíveis portanto ao processo (nesse sentido STF – HC nº. 69.818/SP).

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