sexta-feira, 18 de novembro de 2011

DOLO EVENTUAL ou CULPA CONSCIENTE?

EMBRIAGUEZ AO VOLANTE E ACIDENTE FATAL – MOTORISTA AGE COM DOLO EVENTUAL OU CULPA CONSCIENTE?

Para discernir se a conduta do agente foi impulsionada com DOLO EVENTUAL ou CULPA CONSCIENTE, mister o papel da Autoridade Policial no sentido de analisar as circunstâncias fáticas, mormente pela impossibilidade de se imiscuir no psicológico do agente.
Aliás, ousamos afirmar que somente o Delegado de Polícia poderá fazer tal aproximação e conclusão, visto estar no calor dos acontecimentos conforme determinação legal do artigo 6 do Código de Processo Penal.
Sendo assim, passemos a analisar a diferença de atitudes anímicas - DOLO EVENTUAL ou CULPA CONSCIENTE - frente ao que corriqueiramente estamos assistindo nos noticiários, leia-se, EMBRIAGUEZ AO VOLANTE E ACIDENTE COM VÍTIMA FATAL!

De fato os doutrinadores e aplicadores do direito digladiam-se em estabelecer a diferença entre o dolo eventual e a culpa consciente nos acidentes automobilísticos.
Sendo assim, sustentaremos que, a Autoridade Policial, para além de fundamentar seu entendimento trazendo a tona somente o princípio in dúbio pro societates, pelo simples fato sufragador de que, na fase inquisitiva deverá prevalecer, em caso de dúvida, o princípio ora dito; Faz-se necessário ainda um imprescindível controle da conduta do condutor do veículo automotor, e repita-se, tal atribuição é exclusiva do o Delegado de Polícia que demonstrará pelos fatos, a conduta do agente, ou seja, as evidencias do ocorrido levarão a crer que o condutor do veículo atuou com dolo eventual ou culpa consciente.
Para tanto, é evidente que o fator EMBRIAGUEZ POR SI SÓ não é caracterizador de que o condutor do veículo agiu com dolo. Necessário se faz a demonstração de um plus na conduta do mesmo.
Isso porque, a embriaguez e o acidente automobilístico, por si só, configuram quebra do dever de cuidado objetivo exigido pela Lei de Trânsito, configurador do crime culposo tipificado no artigo 302 do CTB (princípio da legalidade).


Todavia, caso a Autoridade Policial, perceba no contexto fático que, outros fatores fizeram-se presentes no cenário delitivo e contribuíram para a conduta do agente, ou seja, caso fique demonstrado que o agente, além de ter bebido, também estava em alta velocidade, ou deixou de socorrer a vítima, ou mais, passou no sinal vermelho, ou ainda, estava tirando racha, ou então dirigia desabilitado; poder-se-á concluir tranquilamente que o condutor do veículo anuiu com o resultado e não somente confiou, de forma leviana, que ao dirigir embriagado poderia evitar o resultado (culpa consciente).
Fato é que, esse plus demonstrativo do dolo eventual na conduta do condutor de veículo automotor, far-se-á, caracterizado, como exemplificado, pela somatória de fatores que exteriorizarão o móvel do agente. Para tanto, é evidente que tais fatores deverão ficar demonstrados no Auto de Prisão em Flagrante, lembrando sempre que, para este ato, bastará indícios dos mesmos.


Decorre disso aliás, outra pontuação, qual seja, competirá ao condutor do veículo demonstrar que não se faz presente o plus de fatores que externam seu móvel como sendo dolo eventual.
É verdade que o agente tem ao seu lado o princípio de não fazer prova contra si, todavia, para o caso, as provas indiciárias já estarão formadas (por isso sustentamos o imprescindível ofício da Autoridade Policial em fazer valer o artigo 6 do Código de Processo Penal). Posto assim, não se tratará de fazer prova contra si, mas sim de contrapor as provas que pesam em ti!
Podemos até dizer que, essa reunião de fatores comprobatórios da conduta do agente (ou seja, extrair o aspecto anímico de fatores concretos) demonstrará se o condutor do veículo agiu de modo egoístico, torpe, desqualificando seu comportamento, caracterizando assim a anuência do mesmo com o risco de lesar o bem jurídico quando de sua conduta, fato amparador do Auto de Prisão em Flagrante sob a fundada suspeita da configuração do dolo eventual.


Para que nossa posição encontre guarida na doutrina nacional, oportuno se faz lembrar a lição do mestre Nelson Hungria que assim ensinava sobre a diferença entre o dolo eventual e a culpa consciente, verbis: '... a diferença entre estas duas formas (dolo eventual e culpa consciente) apresenta-se quando se faz a seguinte pergunta: por que em um e outro caso, a previsão das consequências possíveis não impediu o culpado de agir? A esta pergunta uma resposta diferente deve ser dada, segundo haja o dolo eventual ou a culpa consciente. No primeiro caso (dolo eventual), a importância inibitória ou negativa da representação do resultado foi, no espírito do agente, mais fraca do que o valor positivo que este emprestava à prática da ação. Na alternativa entre duas soluções (desistir da ação ou praticá-la, arriscando-se de produzir o evento lesivo), o agente escolheu a segunda, para ele o evento lesivo foi como o menor de dois males! Em suma, pode dizer-se, no caso de dolo eventual, foi por egoístico motivo que o inculpado se decidiu a agir, custasse o que custasse. Ao contrário, no caso de culpa consciente, é por leviandade, antes que por egoísmo, que o inculpado age, ainda que tivesse consciência do resultado maléfico que seu ato poderia acarretar. Nesse caso, com efeito, o valor do resultado possível era, para o agente, mais forte que o valor positivo que atribuía à prática da ação. Se estivesse persuadido de que o resultado sobreviria realmente, teria sem dúvida, desistido do agir. Não estava, porém, persuadido disso. Calculou mal. Confiou em que o resultado não se produziria, de modo que e a eventualidade, inicialmente prevista, não pôde influir plenamente no seu espírito. Em conclusão: não agiu por egoísmo, mas por leviandade – culpa consciente; agiu com egoísmo e não refletiu suficientemente – dolo eventual’. (in Comentários ao Código Penal Rio de Janeiro, editora Forense).
Para sedimentar nossa posição, colacionamos as profícuas palavras de Eugenio Raúl Zaffaroni e José Henrique Pierangeli, que assim identificam a conduta daquele que age com dolo eventual, verbis: “O dolo eventual, conceituado em termos correntes, é a conduta daquele que diz a si mesmo ‘que aguente’, ‘que se incomode’, ‘se acontecer, azar’, ‘não me importo’. Observa-se que aqui não há uma aceitação do resultado como tal, e sim sua aceitação como possibilidade”. (Manual de Direito Penal Brasileiro – Parte Geral, editora Revistas dos Tribunais).


Apesar de sensível a diferença entre essas duas atitudes psíquicas – dolo eventual e culpa consciente – E mais, por haver entre elas, um TRAÇO COMUM, qual seja, a PREVISÃO DO RESULTADO ANTIJURÍDICO, restar-se-á demonstrado que o condutor de veículo automotor embriagado agiu com dolo eventual diante da análise concreta da conduta do mesmo, aclarando-se que o agente, preferiu arriscar-se a produzi o resultado (morte ou lesão da vítima), ao invés de renunciar à ação, logo, agiu com egoísmo e não refletiu suficientemente.


Parafraseando a capitular colocação de Frank representativa do dolo eventual, podemos dizer que os fatos deverão demonstrar que o agente assim retratou o motivo egoístico do elemento subjetivo de sua conduta: ‘seja como for, dê no que der, em qualquer caso, não deixo de agir’.


Aliás, salutar é o ensinamento do insigne Antonio Benedicto dos Santos que assim retrata nos dias atuais os acidentes de trânsito, verbis: “entre as hipóteses sintomáticas de dolo eventual, estão, com certeza, os acidentes provocados por excesso de velocidade aliados a embriaguez, e aqueles denominados ‘rachas’. Embora seja prática costumeira em nosso país o lançamento de tais ocorrências na vala comum dos crimes culposos, o procedimento de algumas autoridades, em episódios recentes, talvez represente aquela tão aguardada ‘revolução copernicana’ no enfoque da matéria, o que, por certo, contribuirá para que o Brasil desça do pódio de país recordista de mortes e ferimentos no trânsito.” (Delitos de Trânsito: culpa consciente ou dolo eventual? – RT 715/409).


Retrato esse que vem justamente ao encontro do preceituado no Supremo Tribunal Federal pelo Ministro Celso de Mello, verbis: “As inúmeras campanhas realizadas, demonstrando o perigo da direção perigosa e manifestamente ousada, são suficientes para esclarecer os motoristas da vedação legal de certas condutas, tais como o racha, a direção em alta velocidade, sob embriaguez, entre outras. Se, apesar disso, continua o condutor do veículo a agir dessa forma nitidamente arriscada, estará demonstrando o seu desapego à incolumidade alheia, podendo responder por delito doloso”. (STF, rel. Min. Celso de Mello, RT 733/478).

Urge salientar ainda que, não estamos desconsiderando a recente decisão do próprio Supremo Tribunal Federal, publicada em 06/09/2011, que encontrou como redator o Ministro Luiz Fux, contrariando a relatoria da Ministra Carmen Lúcia, no sentido de conceder a ordem no HC 107801, descaracterizando o dolo na conduta do motorista de veículo automotor; por onde se segue a ementa, verbis: "PENAL. HABEAS CORPUS. TRIBUNAL DO JÚRI. PRONÚNCIA POR HOMICÍDIO QUALIFICADO A TÍTULO DE DOLO EVENTUAL. DESCLASSIFICAÇÃO PARA HOMICÍDIO CULPOSO NA DIREÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR. EMBRIAGUEZ ALCOÓLICA. ACTIO LIBERA IN CAUSA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DO ELEMENTO VOLITIVO. REVALORAÇÃO DOS FATOS QUE NÃO SE CONFUNDE COM REVOLVIMENTO DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. ORDEM CONCEDIDA. 1. A classificação do delito como doloso, implicando pena sobremodo onerosa e influindo na liberdade de ir e vir, mercê de alterar o procedimento da persecução penal em lesão à cláusula do due process of law, é reformável pela via do habeas corpus. 2. O homicídio na forma culposa na direção de veículo automotor (art. 302, caput, do CTB) prevalece se a capitulação atribuída ao fato como homicídio doloso decorre de mera presunção ante a embriaguez alcoólica eventual. 3. A embriaguez alcoólica que conduz à responsabilização a título doloso é apenas a preordenada, comprovando-se que o agente se embebedou para praticar o ilícito ou assumir o risco de produzi-lo. 4. In casu, do exame da descrição dos fatos empregada nas razões de decidir da sentença e do acórdão do TJ/SP, não restou demonstrado que o paciente tenha ingerido bebidas alcoólicas no afã de produzir o resultado morte. 5. A doutrina clássica revela a virtude da sua justeza ao asseverar que “O anteprojeto Hungria e os modelos em que se inspirava resolviam muito melhor o assunto. O art. 31 e §§ 1º e 2º estabeleciam: 'A embriaguez pelo álcool ou substância de efeitos análogos, ainda quando completa, não exclui a responsabilidade, salvo quando fortuita ou involuntária. § 1º. Se a embriaguez foi intencionalmente procurada para a prática do crime, o agente é punível a título de dolo; § 2º. Se, embora não preordenada, a embriaguez é voluntária e completa e o agente previu e podia prever que, em tal estado, poderia vir a cometer crime, a pena é aplicável a título de culpa, se a este título é punível o fato”. (Guilherme Souza Nucci, Código Penal Comentado, 5. ed. rev. atual. e ampl. - São Paulo: RT, 2005, p. 243) 6. A revaloração jurídica dos fatos postos nas instâncias inferiores não se confunde com o revolvimento do conjunto fático-probatório. Precedentes: HC 96.820/SP, rel. Min. Luiz Fux, j. 28/6/2011; RE 99.590, Rel. Min. Alfredo Buzaid, DJ de 6/4/1984; RE 122.011, relator o Ministro Moreira Alves, DJ de 17/8/1990. 7. A Lei nº 11.275/06 não se aplica ao caso em exame, porquanto não se revela lex mitior, mas, ao revés, previu causa de aumento de pena para o crime sub judice e em tese praticado, configurado como homicídio culposo na direção de veículo automotor (art. 302, caput, do CTB). 8. Concessão da ordem para desclassificar a conduta imputada ao paciente para homicídio culposo na direção de veículo automotor (art. 302, caput, do CTB), determinando a remessa dos autos à Vara Criminal da Comarca de Guariba/SP.".


De fato, o que estamos sustentando é que, o fator contributivo para se estabelecer a conduta dolosa do agente embriagado na direção de veículo automotor, é o concatenar de atos que evidenciam um plus na conduta do mesmo no sentido de contribuir para estabelecer o presumido aspecto subjetivo. Isso porque, repita-se, O QUE PASSA NA MENTE HUMANA SOMENTE DIZ RESPEITO PARA QUEM O PENSA, logo, aos aplicadores do direito compete (principalmente e porque não dizer tão somente a Autoridade Policial) retirar ilações do caso concreto no sentido de se aproximar ao máximo do que se acredita que fora o móvel do agente. Contando para isso de evidencias (E NÃO UMA EVIDENCIA, como dito na recente decisão do Pretório Excelso) do que se permeou na conduta do agente embriagado na direção do veículo automotor.


É evidente que teremos vozes doutrinárias e de aplicadores do direito no sentido de que a postura sustentada aqui, estaria a sufragar um Direito Penal “Populista”, contudo, mais uma vez não estamos sozinhos em nossa posição, pois, decisões dos tribunais são uníssonas no sentido aqui estabelecido, verbis: “Não se pode generalizar a exclusão do dolo eventual em delitos praticados no trânsito.(...) O dolo eventual, na prática, não é extraído da mente do autor mas, isto sim, das circunstancias. Nele, não se exige que o resultado seja aceito como tal, o que seria adequado ao dolo direto, mas, isto sim, que a aceitação se mostre no plano do possível, provável.” (STJ, rel. Min. Felix Fischer, RT 810/573). “Na culpa consciente o agente tem previsibilidade do resultado, porém não o quer, não acredita que ocorra, tem confiança de que não vai acontecer. No dolo eventual, o agente tem previsibilidade do resultado, não quer que aconteça, porém prossegue na ação admitindo e aquiescendo, sem alterar sua conduta, possível o evento. À evidencia não há como penetrar no subjetivo do agente/condutor para saber se presente a vontade, assumindo o risco do resultado letal. A única forma de concluir pela existência do dolo (eventual) na circulação de veículo no trânsito, atividade que já traz inerente o risco. Poderá haver dolo eventual, quando o condutor dirige em velocidade irrazoável, excessiva, sob efeito de bebida alcoólica ou entorpecente, realiza ‘rachas’ em via pública, intercepta a circulação normal andando em ziguezague, realizando manobras perigosas ou ainda, transporta displicentemente cargas perigosas, circula em veículo sem as mínimas condições tendo plena consciência de previsibilidade do evento. Acima, enumeradas, exemplificativamente, circunstancias podendo haver outras violadoras das regras de trânsito que individual ou em conjunto, indicam a presença do dolo eventual. Ou seja: se o agente tinha previsibilidade que o evento letal poderia ocorrer, mas mesmo assim, voluntariamente, sem censura a impedir o prosseguimento da ação aquiesceu com resultado letal.” (TJRS, ApCrim 70021811996, j. 24.01.2008, rel. Elba Aparecida Nicolli Bastos).


Posto assim, concluímos que os REQUISITOS CONFIGURADORES DO DOLO EVENTUAL, quais sejam:
a) o agente teve consciência de que, com sua atuação, poderia seriamente lesar ou pôr em perigo um bem jurídico, como de fato ocorreu; e,
b) o agente atuou com indiferença diante dessa séria possibilidade de lesão ou colocação em perigo do bem jurídico, de modo a assumir o risco de sua produção, tudo retratado diante das EVIDENCIAS demonstrativas do plus na conduta do mesmo.
Deverão estar demonstrados no Auto de Prisão em Flagrante, lembrando que, o Código Penal Brasileiro adotou Teoria do Consentimento em relação ao dolo eventual (artigo 18, I, parte final, do Código Penal), sendo certo que TAMBÉM É DOLO, a vontade que, embora não dirigida diretamente ao resultado previsto como provável ou possível, consente na sua ocorrência assumindo o risco de produzi-lo, sendo a produção do resultado indiferente para o agente, fato demonstrado diante da análise do caso concreto, atribuição exclusiva da Autoridade Policial, frente a seus ofícios de operador do direito. Lembrando que, é garantia não produzir prova contra si, mas é dever provar que o que está sendo imputado não condiz com a realidade!

2 comentários:

  1. STF - PRIMEIRA TURMA - DECISÃO DE 18/10/2011 - Informativo 645

    “Racha” e dolo eventual - Parte 1

    A 1ª Turma, por maioria, denegou habeas corpus em que alegado constrangimento ilegal decorrente de: a) falta de fundamentação da sentença de pronúncia, porquanto genérica; b) substituição indevida de relatores na ocasião do segundo julgamento de recurso em sentido estrito, uma vez que a mesma desembargadora — que anteriormente proferira voto prevalecente pelo provimento do apelo — mudara sua convicção; c) excesso de linguagem no acórdão confirmatório da decisão que pronunciara o réu; e d) contradição neste decisum, haja vista que o conselho de sentença entendera que o co-réu não participara da disputa dolosamente, mas culposamente. No mérito, a defesa sustentava que a conduta objeto da denúncia não caracterizaria dolo eventual, mas culpa consciente, pelo que pugnava pelo deferimento da ordem, a fim de que fosse determinada a competência do juízo singular, e não do tribunal do júri, para julgar o paciente. De início, assinalou-se que o juízo pronunciante teria cumprido seu dever de fundamentação, de modo a não incidir em excesso de linguagem, tendo em vista que ele apenas teria demonstrado seu convencimento acerca da materialidade do crime e dos indícios de autoria. Outrossim, ressaltou-se que a fundamentação do voto condutor do acórdão que confirmara a pronúncia também teria observado os limites inerentes à espécie de provimento jurisdicional, ao assentar a comprovação da materialidade do fato e dos indícios suficientes de autoria, consoante a norma vigente à época (CPP, art. 408: “Se o juiz se convencer da existência do crime e de indícios de que o réu seja o seu autor, pronunciá-lo-á, dando os motivos do seu convencimento”). Ademais, consignou-se que nada impediria que o mesmo magistrado, ao participar de nova apreciação de recurso, revelasse convencimento diverso, desde que devidamente motivado. No ponto, asseverou-se que, verificada a anulação do primeiro julgamento, este não condicionaria a manifestação do órgão julgador no segundo.
    HC 101698/RJ, rel. Min. Luiz Fux, 18.10.2011. (HC-101698)

    JAIME PIMENTEL JUNIOR

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  2. “Racha” e dolo eventual - 2
    Quanto ao mérito, distinguiu-se o caso dos autos daquele versado no HC 107801/SP (DJe de 13.10.2011), que cuidara de homicídio na direção de veículo automotor cometido por agente sob o efeito de bebidas alcoólicas. Rememorou-se que o Colegiado limitara a aplicação da teoria da actio libera in causa aos casos de embriaguez preordenada. Sublinhou-se, entretanto, que não se deveria generalizar a compreensão de que qualquer homicídio praticado na direção de veículo automotor seria culposo, desde que tratasse de embriaguez preordenada. Elucidou-se que a diferença entre dolo eventual e culpa consciente encontrar-se-ia no elemento volitivo do tipo penal. Todavia, ante a impossibilidade de se adentrar a psique do agente, essa análise exigiria a observação de todas as circunstâncias objetivas do caso concreto. Nesse sentido, dessumiu-se, da descrição dos fatos realizada pelas instâncias ordinárias, que o réu, ao lançar-se em prática de altíssima periculosidade em via pública e mediante alta velocidade, teria consentido com que o resultado se produzisse, de sorte a incidir em dolo eventual (CP, art. 18, I: “Diz-se o crime: I - doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo”). No ponto, assentou-se que o Supremo firmara jurisprudência no sentido de que o homicídio cometido na direção de veículo automotor em virtude de “pega” seria doloso. Desta feita, aludiu-se que a prática de competições automobilísticas em vias públicas seria crime autônomo, doloso e de perigo concreto (CTB, art. 308: “Participar, na direção de veículo automotor, em via pública, de corrida, disputa ou competição automobilística não autorizada pela autoridade competente, desde que resulte dano potencial à incolumidade pública ou privada”). Enfatizou-se que este tipo penal, se resultar em lesão corporal ou homicídio, progrediria para os delitos dispostos nos artigos 129 ou 121 do CP, em sua forma dolosa, visto que seria contra-senso transmudá-lo para a modalidade culposa em razão do advento de resultado mais grave. Assim, reconheceu-se presente o elemento volitivo do dolo eventual. Por fim, explicou-se tanto haver hipótese de “racha” entre dois condutores, assim como de apenas um motorista, que poderia perseguir outro veículo, o que denotaria um único imputável para a prática. Vencido o Min. Marco Aurélio, que concedia a ordem, para que os 2 réus respondessem criminalmente pelo fato tendo em conta o art. 302 do CTB (“Praticar homicídio culposo na direção de veículo automotor”).
    HC 101698/RJ, rel. Min. Luiz Fux, 18.10.2011. (HC-101698)

    JAIME PIMENTEL JUNIOR

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